Carta para mim mesma

Quando esse blog ainda era um caderno manuscrito, ele era um compilado de cartas; completamente inspirado na saudosíssima Fernanda Young, que à época escrevia uma coluna para a revista Claudia, intitulada Cartas. Foi VOCÊ quem me demoveu dessa ideia e disse que eu deveria criar algo totalmente e completamente meu. E anônimo, assim, talvez para combinar com o nome do seu antigo blog (e até hoje um dos meus preferidos), O Anônimo Célebre.

Assim nasceu esse espaço, há 16 anos, contando a vida de uma jovem jornalista, mãe solteira, recém instalada na Selva de Pedra, apaixonada pela vida, pelo melhor amigo em segredo – que viraria o amor da vida dela e marido -, e uma grande pseudo filósofa de botecos da Vila Mariana, sentindo tudo sempre à flor da pele.

Mas essa não é uma história de amor como tantos outros textos que aqui jazem. Nem um conto de sexo (pelo qual esse blog é premiado) ou uma história de dor compartilhada. Quando comecei a escrever esse texto a ideia era ser uma carta para VOCÊ, até que percebi que essa história, essa carta, é, afinal, toda sobre mim. E que ela é feliz. Mas está longe do final – o meu, vamos esclarecer. Porque a garota que te amou por 16 longos anos e esse blog chegaram ao fim. Juntos; assim como começaram: com e por VOCÊ.

Novembro de 2023

Poder conversar abertamente, uma década depois do nosso divórcio, já mais amadurecidos e sem a mágoa pulsando, foi essencial. Poder reviver parte desse romance foi mágico; foi voltar para casa depois de uma looonga viagem, ao te abraçar e tocar tua pele, reencontrando seu cheiro. Foi ter a certeza do que eu sempre sentia no fundinho do coração: eu nunca deixei de te amar. Contudo, pude perceber claramente o quanto somos diferentes. Algo que a menina puramente romântica e completamente apaixonada não enxergava aos 24 anos.

Dezesseis anos pode parecer pouco diante de uma vida, mas ao me dar contar de que eu ainda só tenho 41, percebi que foram aqueles 16 anos essenciais, em que a gente está vivendo ao máximo, se descobrindo, querendo ganhar o mundo. E ainda por cima, eu estava criando outra pessoa. E te amando em todas as suas versões – sob essa ótica, foram 20 anos amando você: do amigo ao ex-marido (passando pelo profissional, padrinho, compadre, roomate, amante, namorado, noivo… ufa!). Te amei até quando berrava que te odiava; te amei quando chorava tuas saudades, sufocando seu nome no travesseiro; te amei quando me odiava por não conseguir te esquecer; te amei quando não conseguia aprofundar meus relacionamentos com medo que alguém tomasse o lugar que era só seu; odiava o fato de compará-los e ninguém ser tão bom quanto você, afinal depois de você os outros foram os outros e só.

Só que – veja a ironia – se o tempo nos ensina a importância do perdão, ele não perdoa: 11 anos separados me mostrou que a verdade que eu vivia era, na verdade, uma ilusão. Foi dolorido entender que apesar de todo amor que eu ainda tinha, a gente já não tinha mais nada em comum. Ainda que não doesse tanto agora, era preciso te perder de novo. E, dessa vez, perder (de vez) uma parte de mim: a garota que te amou por tanto tempo, a mulher que “cresceu” se perguntando “o que ele faria nessa situação?”. Pois eu não podia ignorar a realidade, desprezar a mulher que eu sou hoje, e que, de forma alguma, se apequenaria para caber em situações que aquela garota aceitava tão feliz. É doído (re)conhecer nossos heróis tão de perto, retirá-los do pedestal que a gente mesmo os colocou.

Eu precisei te perder para me encontrar. Eu precisei te reencontrar para dar resolução no que achei que resolvido estaria – se eu apenas escondesse embaixo de uma camada bem grossa de mim. Eu precisei nos reviver para entender que eu precisava deixar ir embora essa parte sua que já não é mais minha. Essa parte… eu já sou uma outra alguém. Mas eu respeito e amo nossas histórias. Nossas gargalhadas, nossa cumplicidades e nossas peculiaridades. Eu amo e honro tudo que você me tornou e tudo que eu transformei em VOCÊ.

Contraditório? Um pouco. Libertador? Também! É um pouco como a mordida no lábio depois de um beijo doce, desse que você tem e encaixa tão bem com o meu. É também como a piada que não encaixa mais. É como saber que pode ter amor, mas é preciso mais que apenas isso. É preciso querer mais!

Assim, sem mais delongas, eu me despeço (até porque já estou me despedindo há alguns meses) e me abro para receber um mundo completamente novo. Mas sem esquecer de te agradecer por TANTO.

Para quem acompanhou o blog por esse tempo todo, meu muito obrigada! Ele foi um pequeno grande diário, cujo principal tema sempre foi amor – e meu maior muso inspirador foi a pessoinha da foto.

Dezesseis anos depois… enfim, vida nova!

Com todo meu amor por mim e para vocês,
Michelle Derubins Vargas.

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